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A Coordenadoria de Combate ao Racismo e Todas as Outras Formas de Discriminação (CCRAD) do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) realizou nesta quarta-feira, 24 de novembro, um debate em torno do tema Racismo institucional: desafios e perspectivas de enfrentamento pelo Ministério Público. O evento integrou as atividades que celebram o Mês da Consciência Negra.

O promotor de Justiça Francisco Angelo Silva Assis, coordenador em exercício da CCRAD e do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos (CAO-DH), conversou com a promotora de Justiça e coordenadora do Grupo de Atuação Especial de Proteção dos Direitos Humanos e Combate à Discriminação (GEDHDIS) do Ministério Público da Bahia, Lívia Maria Sant’Anna Vaz.

Lívia foi reconhecida, em 2020, como uma das 100 pessoas de descendência africana mais influentes do mundo, sendo a única brasileira com atuação no Sistema de Justiça a receber tal homenagem do Mais Influente Afrodescendente (Mipad).

A promotora baiana iniciou sua apresentação falando sobre as diferentes noções de racismo – estrutural, institucional e interindividual. Ela apontou que o racismo estrutural constitui um dos pilares da sociedade brasileira, camuflado por uma alegada democracia racial que nunca existiu no país. “Trata-se de um racismo orgânico, com uma dinâmica que o leva a se rearranjar constantemente, à medida que ações contrárias se fortalecem. Por isso, temos que também sempre buscar novas e diferentes estratégias para combatê-lo”, disse Lívia Vaz.

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Para exemplificar o racismo institucional, Lívia apresentou um estudo do Instituto Ethos, realizado em 2016, que levantou a presença de negros nas 500 maiores empresas do Brasil. Os dados mostraram a menor proporção dessa presença em cargos de remuneração mais alta e de maior poder decisório, expondo um filtro racial que beneficia aqueles que tiveram mais oportunidades durante sua formação.

Em instituições como o Ministério Público e no Poder Judiciário a ausência de pessoas negras se repete. Lívia apresentou o que, em sua análise, são os maiores desafios para o enfrentamento dessa realidade dentro do MP brasileiro.

Um dos principais obstáculos é a falta de um olhar para dentro que objetive reconhecer o racismo institucional e criar mecanismos para enfrentá-lo. “O compromisso com a diversidade deve ser uma política das instituições. Mesmo em concursos que contemplam cotas raciais, muitas vezes cláusulas de barreiras são impeditivos para alguns. Da mesma forma, as provas de ingresso na carreira não abordam temas antirracistas, passando a ideia de que são desnecessárias para atuação dos membros do Ministério Público”, explicou Lívia.

Ela identifica nessa sub-representação um impacto direto na forma como os membros do MP atuam ou deixam de atuar, reproduzindo a hierarquização do racismo e tornando-se condescendente com essa prática. “A omissão, representada pelo não atuar ou não dar valor a propostas antirracistas, garante que a engrenagem continue girando”, alerta a promotora.

Lívia ressalta que já há um arcabouço significativo de normas constitucionais, normativas internacionais, resoluções do Conselho Nacional do Ministério Público que permitem uma

série de iniciativas que contribuiriam para a concretização de ações afirmativas nos Ministérios Públicos. Entretanto, muitas administrações buscam argumentos, como a ausência de uma legislação específica, para se absterem de implantar novas medidas. “No fim das contas é uma decisão política”, define.

Entre as estratégias para ultrapassar as barreiras, Lívia Vaz cita o constrangimento, no sentido de transmitir para a instituição a necessidade de que ela assuma que entre suas obrigações está a de promover a igualdade racial e desenvolva ações para isso. Outro ponto relevante é a articulação entre os integrantes antirracistas das instituições e movimentos sociais para ouvir a voz da população e levar efetividade à atuação.

O coordenador em exercício do CCRAD, promotor de Justiça Francisco Angelo, citou a criação, este ano, da coordenadoria e do Grupo de Trabalho Antirracismo como símbolos da força institucional com a qual o MPMG conta para trilhar os caminhos apontados por Lívia e chegar a resultados concretos. “É um tema caro não apenas ao Direito, mas a outras ciências e à sociedade como um todo. Encontrar um lugar de reflexão e ação e combater não apenas o racismo, mas outras formas de discriminação, como a religiosa, a xenofobia, a homofobia, é muito importante para suplantarmos as consequências de muitos anos de silenciamento”, concluiu ele.

Assinatura Cejor

 

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