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Comemoração de uma década de criação da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência inspira sociedade civil e instituições públicas a refletirem sobre avanços e desafios

 

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Diante dos constantes conflitos entre toda uma vizinhança do centro de Caeté e uma senhora de 74 anos em situação insalubre de acumulação de lixo, entulho e animais domésticos em casa, parecia não haver caminhos para alguma resolução do impasse. Impaciente com a falta de saídas para o problema, a comunidade procurava apoio de ONGs, prefeituras, polícia e vereadores. Entre decisões judiciais inviabilizadas por recusas da idosa e acúmulos de novas denúncias, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) obteve na Justiça a nomeação de um irmão como “apoiador” – figura introduzida no arcabouço jurídico pela Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência. A função, segundo o texto legal, é garantir à apoiada, diagnosticada com transtorno bipolar, a execução de suas próprias vontades, porém com auxílio de pessoas de confiança. Neste recente caso, a nomeação possibilitou ao apoiador autorizar a limpeza do local e o tratamento dos animais. 

 A solução encontrada no caso de Caeté ilustra apenas um dos diversos direitos conquistados pelas pessoas com deficiência amparados na Lei da Inclusão, que completa 10 anos no próximo domingo, 6 de julho. Aprovado em 2015 após ampla pressão popular e debate com organizações da sociedade civil, o novo arcabouço garantiu a capacidade civil plena das pessoas com deficiência, tipificou crimes de discriminação e violência e possibilitou o desenho de direitos transversais, ou seja, que envolvem simultaneamente áreas como educação, trabalho, transporte, saúde, lazer, cultura, esporte e participação política. O texto legal ainda assegurou o direito fundamental à igualdade de oportunidades e à não discriminação, prevendo, por exemplo, o direito à educação inclusiva.  

Fundamentação 

A forma como a Lei Brasileira de Inclusão lida com o tema da deficiência não é propriamente uma invenção nacional. Para além da pressão de movimentos organizados, a criação do texto legal fez eco à Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada pela assembleia geral da Organização das Nações Unidas (ONU) em 2006. A partir desse documento, consolidou-se a ideia de que a deficiência não é um defeito a ser superado por seu portador, mas sim resultado do despreparo da sociedade para incluir as pessoas em suas singularidades.  "Por isso, falamos em modelo social da deficiência, e não mais no modelo médico, que entendia que a característica física, intelectual, mental ou sensorial da pessoa justificaria sua condição de deficiência", disse a coordenadora do Centro de Apoio Operacional dos Direitos das Pessoas Idosas e das Pessoas com Deficiência do MPMG, Érika Matozinhos. 

Incorporada à lei brasileira, a mudança de percepção impacta a sociedade como um todo e coloca responsabilidades nas mais diferentes instâncias de políticas públicas. Isso porque a fatia da população que apresenta algum tipo de deficiência é de 18%, segundo dados de 2022 da Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios (PNAD) Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Isso significa que quase um em cada cinco brasileiros enquadra-se nos requisitos definidos pela lei e, portanto, podem buscar apoio de instituições da Justiça caso sintam-se desrespeitadas em seus direitos. Para fins legais, a Lei Brasileira de Inclusão considera pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial. Isso abrange um espectro amplo de condições, como pessoas que usam cadeira de rodas, pessoas cegas ou com baixa visão, pessoas surdas ou com deficiência auditiva, pessoas com deficiência intelectual, pessoas com paralisia cerebral e indivíduos com Transtorno do Espectro Autista (TEA), por exemplo.

Matozinhos enfatiza que, apesar de ser a lei mais avançada do mundo em matéria de inclusão, a LBI precisa ser mais conhecida pela sociedade civil e pelas instituições para que os efeitos sejam aprofundados no cotidiano da comunidade. Para tanto, a coordenadora ressalta a necessidade de um "letramento sobre a pessoa com deficiência". Esse letramento vai além da simples alfabetização, buscando ensinar conceitos e direitos, e, mais importante, enxergar a pessoa com deficiência como um ser humano digno.  

O letramento seria, então, o primeiro passo para a superação social do capacitismo. “Capacitismo nada mais é do que discriminar a pessoa em razão da sua deficiência, seja do ponto de vista da discriminação direta, seja aquela que é camuflada, maquiada em boas intenções”, explica Matozinhos. A prática desse tipo de preconceito, seja velado ou aberto, contribui para perpetuar estereótipos de que as pessoas com deficiência são incapazes de conquistar autonomia e que, portanto, não têm condições de participar ativamente da sociedade. 

Entre avanços e desafios por parte do MPMG, a promotora de Justiça cita a fiscalização e ampliação de serviços essenciais como residências inclusivas (moradias comunitárias bancadas pelo Estado com cuidados especiais) e centros-dia (unidade especializada para suporte a cuidados básicos durante o dia). Outro ponto fundamental envolve soluções para o acolhimento familiar e a criação de equipamentos que integrem saúde e assistência social, evitando a "internação social", ou seja, quando a pessoa fica internada mesmo sem uma razão de saúde que assim o justifique. No tema da mobilidade urbana, Matozinhos considera urgente trabalhar por transportes mais acessíveis e infraestrutura adequada. O MPMG, segundo a coordenadora, tem agido ainda para garantir a reserva de vagas e combater a discriminação, inclusive em carreiras militares.  

Em alusão aos dez anos da lei, a Promotora de Justiça participou do programa Rádio MP Entrevista. Confira a íntegra abaixo. 

Com informações da Agência Brasil. Foto Paulo Pinto/ABr.

 

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