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Debatedores reforçam compromisso constitucional do Ministério Público de trabalhar por uma sociedade mais justa, igualitária e livre de discriminações

 

O enfrentamento a todas as formas de discriminação foi o tema da ação educacional realizada nesta quarta-feira, 30 de novembro, pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), por meio do Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional (Ceaf) da instituição e da Coordenadoria de Combate ao Racismo e Todas as Outras Formas de Discriminação (CCRAD). 

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Intitulado "Perspectivas Antidiscriminatórias: contribuições para o Ministério Público promover o enfrentamento a todas as formas de discriminação", o evento ocorreu no Zoom da Escola Institucional e teve por objetivo principal a formação interdisciplinar dos integrantes da instituição. 

A atividade contou com duas palestras. A primeira, sobre “Racismo, Discriminação e Direito”, foi ministrada pelo promotor de Justiça do Ministério Público do Mato Grosso do Sul (MPMS) Marcos André Cardoso e teve como debatedora a promotora de Justiça do MPMG Ana Gabriela Brito Melo Rocha. 

Já a segunda, intitulada “Criminalização da homotransfobia: desafios de concretude e efetividade das decisões do STF pelo sistema de justiça”, foi apresentada pelo professor da Universidade Federal de Ouro Preto e do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais Alexandre Bahia e contou, como debatedora, com a promotora de Justiça Ana Catharina Machado Normanton. O coordenador da CCRAD, promotor de Justiça Allender Barreto Lima da Silva, presidiu as duas mesas de discussão. 

A abertura do evento foi feita pelo coordenador pedagógico do Ceaf, promotor de Justiça Pablo Gran Cristóforo, que destacou a relevância do tema para a instituição e para a sociedade.  

Racismo, Discriminação e Direito  

Já no início de sua fala, Marcos André Cardoso lembrou a existência de vários vetores sociais responsáveis por inserirem as pessoas no plano social e por sofrerem discriminação, como o gênero, a etnia e a raça. Na sequência, ele discorreu sobre as origens do racismo, falou sobre o racismo estrutural e sobre o que o MP pode fazer para transformar a sociedade, cumprindo o programa estabelecido pela Constituição Federal de construção de uma sociedade livre de discriminações e de preconceitos.  

Mostrando uma foto dele mesmo em uma churrascaria de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, na qual era o único negro, o palestrante frisou que, no Brasil, a segregação racial é clara. “Existem locais que são assinalados para a população negra e outros para a população branca. As pessoas brancas geralmente não percebem isso porque é algo naturalizado e elas não param para observar", explicou. 

Ainda segundo o palestrante, homens e mulheres brancos não estão acostumados a serem classificados racialmente. “Por isso, ao se falar sobre a branquitude e os privilégios que possuem, elas geralmente se irritam”, analisou.  

O promotor Marcos André definiu também, em sua fala, racismo estrutural como sendo “a estrutura social que hierarquiza grupos sociais e que garante vantagem para o grupo dominante e desvantagens para os grupos subordinados”. De acordo com ele, mais grave do que a discriminação direta é a indireta, porque é praticada de forma naturalizada. 

O palestrante ressaltou, ainda, que, no Brasil, 84% dos mortos por intervenção policial são negros, assim como 67% dos policiais que morrem nessas ações, embora a composição das polícias seja predominantemente branca. “Isso é explicado por dois problemas muito graves: o preconceito e os estereótipos. Essas são as principais barreiras contra o racismo”, afirmou. 

Ao debater o tema, a promotora Ana Gabriela Brito defendeu que, para o MP brasileiro vencer o racismo estrutural, a instituição precisa de um olhar interno. “A pauta de direitos humanos deve ser tratada como inerente ao Estado brasileiro, não como uma questão do partido A ou B. Este é um compromisso constitucional da instituição. Por isso, promotores e promotoras devem ter uma atuação antirracista”. 

Ana Gabriela ainda destacou que a construção de uma cultura institucional antirracista demanda a implementação de uma agenda antirracista, que contemple, entre suas ações, a exigência do direito antidiscriminatório nos concursos e o letramento da comunidade ministerial para a compreensão do tema. “O racismo não é uma anomalia pontual, é um modo de organização de privilégios. É fundamental que os colegas atuem com uma perspectiva de gênero, raça e classe”, pontuou. 

Criminalização da homotransfobia 

Ao tratar sobre o tema “Criminalização da homotransfobia: desafios de concretude e efetividade das decisões do STF pelo sistema de justiça”, o professor Alexandre Bahia chamou a atenção, já no início de sua fala, para a inexistência de lei federal que trate dos direitos da minoria LGBTQIA+. “Tudo o que conseguimos até hoje foi por meio de decisões judiciais. Isso já revela a discriminação sofrida por essa população. É algo muito sério e que exige uma resposta do Legislativo”, salientou. 

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Conforme o palestrante, LGBTIfobia é a “rejeição ou negação - em múltiplas esferas, materiais e simbólicas - da coexistência, como iguais, com seres afetivo-sexuais que diferem do modelo sexual dominante”. 

Alexandre Bahia também comentou sobre decisões do Supremo Tribunal Federal em favor dos direitos da população LGBTQIA+, como a que reconhece a homotransforbia como uma espécie de racismo (ADO 26/MI 4733) e a que autoriza pessoa trans a mudar o nome mesmo sem cirurgia ou decisão judicial (ADI 4275).  

Ao discorrer sobre as causas da discriminação, o professor recordou que a modernidade é formada a partir da ideia de construção de normalidade, neutralidades e classificações e que o Direito é um dos instrumentos utilizados para isso. "Temos várias possibilidades de ser e existir, mas escolhemos uma e a colocamos numa norma jurídica, fazendo com que todas as outras sejam consideradas desvios. O desvio se torna loucura, doença, crime ou não reconhecimento de direito”, esclareceu. 

A debatedora Ana Catharina Normanton defendeu, por sua vez, que o direito das minorias deve ser respeitado independentemente da opinião das maiorias populares. “São direitos fundamentais essenciais que não podem ficar à deferência das maiorias. Isso é muito conciliável com a democracia. O respeito aos direitos humanos é parte inerente da democracia. Um é sempre pressuposto do outro”, frisou.  

Ainda segundo a promotora, para se combater o preconceito contra a população LGBTQIA+, são necessárias outras políticas públicas, além da de criminalização, que sejam capazes de transformar a qualidade de vida das vítimas. “É muito importante o foco no Legislativo, para que a situação de inércia mude, e que haja investimento em ações educativas”. 

Ao encerrar o evento, o promotor de Justiça Allender Barreto destacou que a atuação do MP contra a homotransforbia não é uma escolha dos promotores e procuradores de Justiça, mas que passa por uma razão pública, por um arcabouço constitucional que a instituição tem a obrigação de dar conta. 

 

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